sexta-feira, 2 de setembro de 2016

RASGAR A CONSTITUIÇÃO?



 Amigo segue um texto de um amigo pessoal , Juiz Federal e Professor da UNICAP ! É longo , mas bastante esclarecedor ! A quem interessar , possa ! " Amigos,
"Perguntam-nos se uma eventual propositura no STF contra as inconsistências formais no julgamento do processo de "impeachment", particularmente no que se refere ao segundo escrutínio em que o Senado Federal deliberou dispensar a ex-presidente da República da segunda penalidade de inabilitação por 8 anos ao exercício de função pública, acarretaria a invalidação de todo o processo, tenho a considerar o que segue.
A resposta só pode ser negativa. Não há uma mínima margem juridicamente válida para se racionar diferentemente.
Com efeito, não vai haver novo julgamento algum. É simples para explicar. O segundo escrutínio constatado no julgamento do processo de "impeachment"da referência foi uma invenção, uma elucubração subjetiva dos que conceberam a inicitiativa, um "plus" de nenhum modo cogitado pela ordem jurídica. Por isso mesmo, o objeto do destaque parlamentar proposto naquele sentido era inconstitucional, portanto o ato reunia objeto ilícito, sendo nulo, assim como nulos são todos os de sua decorrência, não os de sua antecedência.
O primeiro escrutínio, outrossim, fechou tecnicamente o processo de "impeachment", concluiu o ofício jurisdicional atípico procedido pelo Senado da República, do que dever-se-ia suceder tão só os atos de mera ultimação do ciclo processual com a proclamação do resultado e a prolatação da sentença.
Nada obstante, ignorou-se a Constituição Federal, em si autoaplicável no aporte que remete os seus destinatários à regra do seu parágrafo único do artigo 52. Assim, observou-se uma clara sobreexcedência na condução do feito, resultando tratar-se de um manifesto exercício voluntarista de alguns atores da cena do juízo então em curso. Inclusive o presidente do processo respectivo não poderia jamais ter admitido sequer para discussão um destaque parlamentar revestido de ilegalidade, por falta de objeto válido. Uma trivialidade que deixou de ser assimilada pela autoridade processante.
Demais, destaque parlamentar é instrumento de construção do processo legislativo que disto não se trata o processo de "impeachment", que é de natureza político-judicial. Na verdade, a postulação parlamentar do destaque em foco refletiu uma cabal obsolescência do texto do art. 68, parágrafo único, da Lei 1.079/1950, editada sob a vigência da Constituição de 1946 e somente recepcionada pela Constituição de 1988 naquilo que não divergir desta.
É o caso, porque em `46 a Constituição conjuminava as penas de perda do cargo e inabilitação mediante dosimetria desta última que era de ATÉ 5 anos. O Senado, à época, tinha de ser novamente consultado para saber em quanto importaria a segunda pena de inabilitação a ser imposta ao condenado por crime de responsabilidade, mas tampouco se cogitava de exclusão da segunda pena.
No regime da Constituição de `88, por outro lado, a matéria sofreu modificação, haja vista o crescente combate à malversação da coisa pública, razão pela qual o constituinte resolveu conjuminar agora as penas de perda do cargo COM inabilitação POR oito anos para o exercício da função pública, que, aliás, não se confunde com perda de direitos políticos.
Assim sendo, toda a diferença reside nas sutilezas semiológicas das preposições com efeito conjuntivo ou modal cujo emprego sucessivo resulta da evolução do constitucionalismo brasileiro.
Desse modo, não se poderia de modo algum aplicar dispositivo da Lei 1.079/50, o qual foi ABROGADO pela Constituição ora vigente. Absurdo dos absurdos. Paradoxo dos paradoxos. Lei abrogada que reforma norma constitucional vigente. Cabe, pois, urgente sanação sob risco de ser desmoralizada aberta e descerimoniosamente a Constituição da República que, como tal, deixaria de ser República para se tornar oligarquia. Dessa conduta recuperadora da higidez institucional do sistema de normas do Brasil vai depender ou não o sucesso de tudo o mais neste país, do regime de punibilidades e da efetividade do Direito em geral.
Com efeito, fora da lei, não há dúvida, vale a barbárie." Roverto W. Nogueira - Juiz Federal , Professor !

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