terça-feira, 17 de setembro de 2013

As estradas de Dilma continuam no buraco. Cadê, afinal de contas, o seu “novo modelo”?

Às vezes, este ou aquele reclamam: “Que mania essa sua de ficar lembrando o que já escreveu… Isso não é necessário!”. Com a devida vênia aos que divergem, afirmo: É NECESSÁRIO, SIM! Os analistas políticos não se beneficiam menos da falta de memória que grassa entre nós do que os políticos. Contam-se talvez nos dedos de uma só mão os que ousaram chamar a então ministra Dilma Rousseff de incompetente. Fui um deles — e, obviamente, paga-se um preço por isso. Um deles é virar alvo da rede delinquente financiada por estatais e por gestões petistas. Enquanto se exaltava em quase toda parte o temperamento da “gerentona”, que fazia e acontecia, as vozes minoritárias estavam lá, como estive aqui: “Cuidado! Dilma é muito competente em criar a fama de que é competente”. Como diria Caetano Veloso antes de virar um gagá black bloc, ela não “era proveito, mas pura fama”. Poucos enxergavam o “eclipse oculto”.
Ao contrário. Ela era tratada como a rainha solar de uma nova aurora. Em outubro de 2007, a então ministra lançou o seu “novo modelo de privatização de estradas”. Ele viria para combater o “velho modelo”, o do PSDB, aquele que vigorou em São Paulo — que tem nove das dez melhores estradas do país. Na campanha de 2010, os pedágios no estado foram demonizados tanto por Dilma como pelo candidato do PT ao governo, Aloizio Mercadante. Pois bem! No mês que vem, o “novo modelo” de Dilma completa sete anos. É um fiasco retumbante. Este governo está concedendo ao setor privado vantagens de financiamento jamais propostas por tucano nenhum. E, no entanto, a coisa não desempaca.
Por que não? Porque a cultura petista satanizou o sistema de cobrança de pedágios. Criou a impressão de que tanto o almoço como a boa estrada podem sair a custo zero. Oferece, sim, financiamento, mas pretende ser a tutora de um negócio privado. As tolices vão se sucedendo ao longo do tempo. No começo, o governo achou que poderia até tabelar a taxa de retorno dos investidores, exigência que nem Lênin incluiu no NEP (pesquisar a respeito) para tirar a União Soviética do colapso. O fato é que o fantástico modelo dilmista ainda não saiu do papel.
Sim, eu vou lembrar o que escrevi e o que outros escreveram. Com a devida licença de quem não gosta do procedimento. No dia 5 de fevereiro deste ano, quando o governo sofreu um dos muitos reveses na área de privatização de estradas, publiquei o post que segue abaixo, depois do asterisco. Ele próprio, por sua vez, remete a novos posts. Este blog investe também na memória e no didatismo. Também tem, em suma, uma função educativa. Aquele cantor de MPB deve achar que faço essas coisas porque, como é mesmo?, comando um “famoso blog de direita”. Prefiro achar que se trata apenas de colocar os fatos no seu devido lugar, como devem fazer as pessoas direitas.
*
O governo (ver post abaixo) anunciou nesta terça novas condições para a privatização de rodovias federais. Está nesse buraco — literalmente — há quase seis anos. E não consegue sair. O capital privado não comparece. Vamos lá, recuperando um pouco da história e chegando às medidas anunciadas hoje por Guido Mantega
Os leitores mais antigos do blog certamente se lembram do que eu chamaria “O Choque das Previsões”. Corria o ano da graça de 2007, mais precisamente outubro, e a então superministra, supermulher, supercompetente, supersuper (sabem como são aqueles setores da imprensa criadores de mitos…) anunciou um sistema de privatização de estradas que foi considerado, antes mesmo de sair do papel, uma revolução. Os petistas são assim: a coisa nem aconteceu, mas já é um sucesso de crítica. O de público vem depois, na esteira do marketing.
Falei em “Choque de Previsões”? Falei e documento. Elio Gaspari anunciou que o modelo de privatização de Dilma deixava no chinelo o dos tucanos, que só sabem fazer “privataria”. Dilma ainda não tinha atraído um centavo com a sua revolução, mas o jornalista já decretava a sua vitória técnica, intelectual e moral. E eu fiz o contrário e expliquei as diferenças entre o modelo de privatização em São Paulo — muito bem-sucedido — e o do PT. O texto está aquiPara que vocês não tenham de se chatear visitando links, transcrevo em azul o que escrevi no dia 14 de outubro de 2007.
O PT e a ministra Dilma Rousseff não precisam fazer campanha política – quiçá eleitoral – com a privatização das estradas federais. Elio Gaspari faz por eles com muito mais competência e estilo, pondo a serviço dos companheiros o seu estoque de metáforas. Como sabemos, Gaspari resume a política a um conflito entre o andar de cima e o andar de baixo. É assim um Romeu Chap Chap da ideologia. Andou incomodando os petistas aqui e ali, é verdade, mas só o fez porque julgou que, no andar de baixo, estavam fazendo a política do andar de cima. Escreve na Folha e no Globo deste domingo um texto deplorável porque não vai além da propaganda. E, pior, desinforma o leitor. Segue em itálico um trecho. Volto depois.
Na tarde de terça-feira concluiu-se no salão da Bolsa de São Paulo um bonito episódio de competência administrativa e de triunfo das regras do capitalismo sobre os interesses da privataria e contubérnios incestuosos de burocratas. Depois de dez anos de idas e vindas, o governo federal leiloou as concessões de sete estradas (2,6 mil km). Para se ter uma medida do tamanho do êxito, um percurso que custaria R$ 10 de acordo com as planilhas dos anos 90, saiu por R$ 2,70. No ano que vem, quando a empresa espanhola OHL começar a cobrar pedágio na Fernão Dias, que liga Belo Horizonte a São Paulo, cada 100 quilômetros rodados custarão R$ 1,42. Se o cidadão quiser viajar em direção ao passado, tomará a Dutra, pagando R$ 7,58 pelos mesmos 100 quilômetros. Caso vá para Santos, serão R$ 13,10. Não haverá no mundo disparidade semelhante.Se essa não foi a maior demonstração de competência do governo de Nosso Guia, certamente será lembrada como uma das maiores. Sua história mostra que o Estado brasileiro tem meios para defender a patuléia, desde que esteja interessado nisso. Mostra também que se deve tomar enorme cuidado com o discurso da modernidade de um bom pedaço do empresariado. Nele, não se vende gato por lebre. É gato por gato mesmo.
(…)

Voltei
Gaspari sabe, mas finge ignorar (prefere falar, como ele costuma dizer, à choldra que também ignora) que o modelo de privatização das estradas paulistas difere do modelo federal. Em São Paulo, elas tiveram de pagar luvas ao estado. As federais saíram de graça. No preço do pedágio está embutido esse pagamento inicial.
O que é um preço abusivo de pedágio? Trafeguei neste sábado pelas exemplares Bandeirantes, Anhanguera, Washington Luiz e SP-225, duplicada e talvez a estrada mais bem-sinalizada do Brasil. Mesmo num sábado pós-feriado, estavam cheias. É caro andar nessas rodovias? Eu, por exemplo, não acho: avalio o que elas me oferecem em segurança; levo em conta as obras de duplicação – ou o novo trecho da Bandeirantes; considero a infraestrutura que está à disposição dos usuários.
No ano que vem, informa Gaspari, cada 100 quilômetros da Fernão Dias custará R$ 1,42. É verdade. Para o usuário andar no buraco, interrompido, às vezes, pelo asfalto. Quem disse que o modelo de Dilma já deu certo? Há, quando muito, uma expectativa gerada pela propaganda e pelos marqueteiros de ocasião. O consórcio vencedor vai tocar as obras de que a rodovia precisa? Em que velocidade? Não me lembro de nada parecido. Demoniza-se um modelo que, efetivamente, deu certo e se exaltam as glórias de uma escolha cujos resultados podem demorar ainda uma década. Como de hábito nos tempos de Lula, setores da imprensa acabam sendo os maiores aliados da empulhação e da vigarice.
Isto mesmo: declarar que o modelo de concessão das federais é superior àquele das concessões das rodovias paulistas é empulhação eleitoreira e vigarice intelectual. E a razão é simples: ninguém conhece o modelo federal na prática. Ademais, ainda que o leilão de Dilma venha a se mostrar uma revolução, as circunstâncias das concessões hoje são muito diferentes daquelas do passado.
Ora, bastava a Lula declarar bem-sucedida a sua escolha – ainda que ele não saiba no que vai dar – e pronto. Não! Ele e seu partido resolveram se dedicar a seu esporte predileto: demonizar quem veio antes. E, como se vê, com a ajuda de uma parte da imprensa.
Retorno a 2013. Ou: FiascoGaspari errou, e eu acertei. Não porque eu seja melhor do que ele no papel de Mãe Dinah ou porque seja mais inteligente. É que operei com a lógica, e ele com a torcida. Também não dei a esperança no futuro como fato consumado. O modelo maravilhoso de Dilma revelou-se uma fraude. No dia 14 de abril de 2010, escrevi um post intitulado O MODELO DILMA DE PRIVATIZAÇÃO DAS ESTRADAS VAI PARA O BREJO, O BURACO, O DESMORONAMENTO… RÉGIS BITTENCOURT CONTINUA A SER “A ESTRADA DA MORTE”. MATA, SIM, GENTE, MAS O PEDÁGIO PARA O CÉU É BARATINHO.
Sabem o que é mais impressionante? Em 2010, Aloizio Mercadante concorreu ao governo de São Paulo descendo o sarrafo nos pedágios. Amplos setores da imprensa compraram a sua pauta, ainda que o modelo Dilma não tivesse conseguido duplicar 100 metros de estrada. Os petistas ofereciam os seus buracos com pedágio baratinho como alternativa ao modelo que conseguiu ter 9 das 10 melhores estradas do país. Quem cruza a fronteira do estado indo ou voltando sabe quando está entrando ou saindo de São Paulo por causa das… estradas! Isso é apenas um fato.
Em agosto de 2012, cinco anos depois daquele milagre, o governo RELANÇOU o seu modelo de concessão de estradas. Escrevi então post com este título: O megapacote de Dilma. Ou: Gaspari e eu nas estradas esburacadas, porém baratinhas, da governanta!.
Só prazer de pegar no pé? Amor pela picuinha? Não! É que estou com o saco cheio desse método petista de anunciar o grande sucesso do que ainda não aconteceu; de tratar o mero desejo e a mera conversa mole como era inaugural. É claro que não se faz isso sem a conivência de amplos setores da imprensa.
O modelo de 2013Quase seis anos depois daquele milagre de 2007 e seis meses depois do “megapacote de infraestrutura”, Mantega anuncia novas medidas para tentar privatizar as estradas, já que o capital privado não apareceu. As medidas incluem:
– alteração no prazo das concessões: de 25 para 30 anos;
 ampliação no prazo de financiamento dos empréstimos de dinheiro público para as concessionárias: de 20 para 25 anos;
– o patrimônio líquido das emprestas que contraírem os empréstimos não mais precisará corresponder a, no mínimo, 1,3 vez o valor emprestado; basta 1;
– o governo baixou a previsão de elevação do tráfego de 5% ao ano para 4%. Por que isso é importante? Porque interfere no valor do pedágio.
Segundo o ministro Guido Mantega — aquele que prevê o crescimento da economia brasileira com margem de erro de 3,5 pontos para mais —, a taxa de retorno desses empreendimentos é excelente, da ordem 10% ao ano. É mesmo? E por que os interessados não aparecem? Será que os empresários brasileiros não gostam de ganhar dinheiro?
As reportagens que tratam da privatização das estradas ignoram a questão do pedágio, que é central nessa história. Serviu ao proselitismo vagabundo do PT nas eleições de 2010. Muito bem: o governo federal não cobra pela concessão, como fez o governo paulista durante um bom tempo (o modelo já sofreu alterações), e estimula as empresas a competir pelo pedágio mais barato. Como isso não atrai ninguém, cria facilidades para conceder empréstimo de dinheiro público e é menos rigoroso nas garantias e na exigência das obras de reparação e duplicação… Entendam: a variável do ajuste do suposto “pedágio socialmente justo” é a deficiência de infraestrutura. Nessa marcha, sabem quando uma rodovia federal vai se equiparar às melhores estaduais de São Paulo? Nunca!
É isso aí: entre a eficiência rigorosa e a ineficiência supostamente generosa, os petistas escolhem o segundo modelo. É por isso que a infraestrutura brasileira está na pindaíba em que está.

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