Por que muda tanto o programa de governo de Marina Silva? Por que onde quer que ande Marina Silva sempre tem a mão de um assessor estendida para ajudar a subir, a descer, a sentar, a pegar um copo d'água? Por que ao final de cada ato de campanha sempre aparece alguém para estreitar Marina nos braços, como se ela tivesse despendido um enorme esforço para dar a sua mensagem à turba? Por que Marina Silva anda sempre cercada pelas mesmas pessoas, como se fosse uma santa com os seus discípulos?
Faz parte do show. A fragilidade é uma expressão de santidade. Lembra jejum. Uma vida de privações e sacrifícios rumo à luz. Lembra Sidarta Gautama, Jesus Cristo, Mahatma Ghandi. E Marina sabe como ninguém encarnar por debaixo dos seus trapos chiques e colares de sementes a ungida de Deus que ali está para conduzir um povo para o reino da sustentabilidade.
Quando toma a palavra, no entanto, a fragilidade de Marina Silva some e da sua boca sai um discurso emoldurado por sofrimento, mas que no fundo é cínico e ardilosamente mentiroso, como aquele em que ela afirma que os pais passaram fome para que os filhos dividissem um ovo e umas poucas palhas de cebola. Sem contar o bem treinado engasgo da voz embargada, para conter o choro. Épico e altamente cinematográfico! Longe da marqueteria, ninguém passa fome em seringal, dizem os próprios seringueiros acrianos. O trabalho é duríssimo, rude, atroz, mas o Rio Acre é extremamente piscoso. Há uma enorme variedade de fauna e flora que garante carne e frutas em abundância. Todos possuem a sua roça de mandioca para fazer a farinha. No Bagaço da Marina não era diferente.
Aquele não foi um discurso para os pobres, Fui um discurso ardilosamente esculpido para os ricos, que é onde está o eleitorado que coloca Marina em segundo lugar nas pesquisas. Para gerar pena e dó. Com pobre não funciona. Pobre não engole aquela montagem teatral sobre a fome e talvez seja por isso que a ex-petista começa a perder votos nas pequenas cidades e nas classes menos favorecidas. O pobre teria matado a galinha para fazer uma canja. O pobre teria retirado o espinhel cheio de peixes no rio ao lado ou buscado um pássaro na arapuca. O pobre teria batido à porta do vizinho, que certamente estenderia uma xícara de arroz e outra de feijão.
Como personagem, Marina Silva tem uma trajetória esculpida em mogno. Desde o momento em que transformou Chico Mendes, um comunista que lutava por reforma agrária no seu sindicato, em santo ambientalista, com o apoio institucional e financeiro de ONGs internacionais. Quando Chico Mendes morreu, sua história foi habilmente reescrita para funcionar como ícone do domínio que até hoje o PT exerce no Acre e para levar Marina Silva ao Senado. Quando Chico Mendes morreu, Marina Silva não morava no Seringal Bagaço há vinte anos, empenhada que estava em criar a sua carreira política na capital do estado, filiada ao PT. Mas soube vampirizar a imagem do morto para virar figura nacional. Assim como não foi novidade para ela usar o morto Eduardo Campos para alavancar a sua candidatura presidencial, fato que dispensa maiores comprovações. Foi só trocar o "não vamos desistir da Amazônia" por "não vamos desistir do Brasil".
Como ministra, Marina Silva fracassou. Mas ali esculpiu a sua figura mítica. Nenhuma das unidades de conservação criadas por ela está implantada. A maioria existe apenas no papel. Não há dinheiro para indenizar milhares de famílias de pequenos agricultores e de quilombolas que vivem dentro delas,sem poder vender, sem poder comprar, na mais completa insegurança jurídica. Não há projeto, apenas um canetaço. Por meio de resoluções e portarias, a então ministra impediu ou atrasou dezenas de obras essenciais de infra-estrutura e logística, prejudicando setores estratégicos da economia, como o de energia e de transporte. Sua gestão foi caótica, conduzida efetivamente por quem? Pelos discípulos que a cercam, como se ela fosse uma santa frágil, mas cheia de visões de um paraíso, de uma terra onde jorra leite e mel e onde os pães e peixes se multiplicam, como na Bíblia que ela utiliza não para rezar e agradecer, mas como muleta para as suas indecisões.
Marina Silva será diferente da personagem e da ministra se chegar à presidência? Não. Continuará presa ao seu messianismo, deixando para os velhos fiéis discípulos a tomada de decisões, a exemplo do que fazia no Ministério do Meio Ambiente, onde as ONGs internacionais e seus asseclas batiam na mesa e decidiam o futuro de 60% do território nacional. Marina Silva jamais terá a virtude essencial para presidir um país: a última palavra. Enquanto seus discípulos fantasiados de ministros discutirão em colegiado, ela se porá a rezar com a bíblia na mão, à espera de um desígnio divino. A última palavra, principal atributo de um grande presidente, no caso de Marina Silva nunca será dela: será sempre de um discípulo que lhe dará amparo e voz, porque Deus inspira, mas não decide. Tampouco elege e escolhe o presidente da República, este mero mortal cujo principal papel é justamente dar a última palavra. Isso é conosco, os eleitores.
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